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A mostrar mensagens de abril, 2013

Solidão em três tempos

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Sob o céu da cidade com dois nomes um homem caminha sozinho rumo à casa. Anestesiado, não vê a encenação dramática de nuvens convertidas em chamas, de pássaros sem direcção precisa e da velha em cadeira de rodas que parece ter sido abandonada à sua sorte. O homem caminha “para o nada”, segundo o seu próprio juízo. Em casa, à mesa, nunca tem companhia. A velha de aspecto frágil, desamparada, pensa nas maldades adolescentes que cometeu antes da guerra. E uma espécie de brilho satânico desenha na sua face devastada um sorriso em forma de gozo que a faz tremer de satisfação: “A minha irmã era uma boba romântica que lia muita poesia; e gostava tanto daquele canário. Mas eu não tive pena, matei o bicho.” E como por magia, emerge da sua própria sombra outra mulher, mais nova, que começa a empurrar a cadeira. Maria veio da Bolívia com uma promessa de futuro. Rapidamente aprendeu que as palavras “promessa” e “futuro” transportavam a mesma densidade de enganos que havia conhecid

Cейчас я могу говорить // Agora posso falar!

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                                                        "Cейчас я могу говорить." Agora posso falar! A primeira vez que vi este filme parei de respirar logo na primeira cena. Um menino liga a televisão. Dentro dela, um outro menino (a caminho de se tornar um homem) submete-se a um tratamento para curar-se de uma gagueira. Uma mulher, cientista xamânica, pousa-lhe as mãos em cima, e em pouco mais que um minuto o jovem estudante de um instituto de Kharkov já pode dizer o libertador e poético "agora posso falar". O que vem depois é um longo poema cinematográfico esculpido com a matéria mais frágil que há, o tempo. Assumo também que neste grande (enorme, como diz meu amigo Victor Hugo) poema visual que se chama " O espelho ", está contida a minha história mais íntima: as ausências do pai, a mãe que empenha a única jóia de família, os momentos clandestinos de literatura, os deslizes e longos hiatos de uma chamada telefónica. E há a chuva

Aula de geografia: dos rios

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É verdade que o Tejo e o Douro nascem em Espanha, dizia eu ao tradutor árabe em Toledo. Mas é em Portugal onde eles buscam e encontram todo o seu esplendor.