Anotações II

Ler um autor francês traduzido na tua língua e encontrar a palavra "transverberación", usada para descrever os estados de euforia mística de uma Teresa que passou por aqui, e que julgou ter sido o seu coração mordido como se fosse uma fruta pela fome insaciável de um deus sem face. E eu, sem nenhum acessório místico, vejo, nessa cidade de pedra que rechaça o vegetal, as minhas palavras morrerem sob o sol do meio-dia como se fossem peixes sem esperanças. Turistas desavisados procuram a fachada da famosa universidade e eu quero fugir. Na esquina da "Calle Calderón de la Barca", uma parreira ancestral tenta abraçar, com alguma relutância, um prédio. Sigo adiante sem nenhuma ferida no coração e a algiberia plena de palavras desconexas, como se um poema ali estivesse a tilintar em cópias de moedas persas com o rosto triste de Tisafernes. O poema não vem, e eu quero somente respirar.

Comentários

Sun Iou Miou disse…
Está-se a ver que não houve arroubo que te valesse...

(Até que foi uma pequena piada para tentar em vão enxotar os fantasmas que me assaltam na mais triste para mim das cidades de pedra.)

Beijo
M disse…
Era uma leitora assídua do Finisterra. Nem acredito que te reencontrei! Achei que tinha perdido para sempre estas palavras! Beijinhos, Margarida. P.S. Temos sempre a presunção que conhecemos os outros só porque lhes lemos o blog, não é? :)

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