Baudelaire

L'examen de minuit

La pendule, sonnant minuit,
Ironiquement nous engage
A nous rappeler quel usage
Nous fîmes du jour qui s'enfuit :
- Aujourd'hui, date fatidique,
Vendredi, treize, nous avons,
Malgré tout ce que nous savons,
Mené le train d'un hérétique ;

Nous avons blasphémé Jésus,
Des Dieux le plus incontestable !
Comme un parasite à la table
De quelque monstrueux Crésus,
Nous avons, pour plaire à la brute,
Digne vassale des Démons,
Insulté ce que nous aimons
Et flatté ce qui nous rebute ;

Contristé, servile bourreau
Le faible qu'à tort on méprise ;
Salué l'énorme Bêtise,
La Bêtise au front de taureau ;
Baisé la stupide Matière
Avec grande dévotion,
Et de la putréfaction
Béni la blafarde lumière ;

Enfin, nous avons, pour noyer
Le vertige dans le délire,
Nous, prêtre orgueilleux de la Lyre,
Dont la gloire est de déployer
L'ivresse des choses funèbres,
Bu sans soif et mangé sans faim !...
- Vite soufflons la lampe, afin
De nous cacher dans les ténèbres !

********

Bien loin d'ici

C'est ici la case sacrée
Où cette fille très parée,
Tranquille et toujours préparée,

D'une main éventant ses seins,
Et son coude dans les coussins,
Écoute pleurer les bassins:

C'est la chambre de Dorothée.
— La brise et l'eau chantent au loin
Leur chanson de sanglots heurtée
Pour bercer cette enfant gâtée.

Du haut en bas, avec grand soin.
Sa peau délicate est frottée
D'huile odorante et de benjoin.
— Des fleurs se pâment dans un coin.

Charles Baudelaire



Danço sobre o tapete da madrugada na companhia de Cioran, Baudelaire e Leo Ferré. Acho que a minha insónia voltou, aliada ao desejo de não querer escrever. Por isso, qualquer palavra escrita é um pequeno triunfo sobre a minha inércia. Não sei por que faço assim. Não deveria eu respeitar o meu direito a não querer escrever? Há poucos dias disse para uma amiga qualquer coisa sobre isso, que se deve respeitar o nosso desejo de estar em silêncio. Sou um desrespeitador nato.

Cioran conta que quando era criança jogava à bola com crânios, conseguidos do seu amigo coveiro. Disse que fazia isso de forma ingénua. Anos mais tarde envolveu-se, como muitos intelectuais romenos da sua geração, com fascismo que nascia. Jovem, estava encantado com o que os seus belos olhos viam. Depois veio o desengano. Dizem que tinha um olhar crepuscular sobre a civilização e a história. Eu também teria, se tivesse chutado crânios quando criança e "flertado" com o fascismo quando jovem. Amadureceu e morreu em Paris, tempo mais que suficiente para reconhecer o seu erro.

Baudelaire tinha uma mãe muito preocupada com os gastos do filho. Escreveu a beleza de um mundo voraz, em vertigem absoluta, Paris era mesmo uma festa. Penso na Dorothée, e que talvez queria estar na sua companhia agora, a ouvir as engrenagens da noite.

Leo Ferré cantou muitos poetas, todos malditos de alguma maneira. Era um libertário. Se eu pudesse ir contra a barreira do tempo, marcava com ele um encontro e nos embebedaríamos, muito. E depois, íamos a Leningrado fazer uma serenata para Anna Akhmátova. Com sorte, seria uma noite de Primavera e se juntaria a nós Óssip Mandelstam, que como muitos sabem adorava comer doces, e agora dorme o seu sono eterno desterrado em Vladivostok.

Faz frio, é hora de ir dormir...


Comentários

Sun Iou Miou disse…
Sempre longe e nunca longe é suficientemente longe.

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